No decorrer da minha vida aconteceram situações que afetou profundamente a forma de me enxergar, e acredito que esse tenha sido um dos motivos que me coloquei em tantas relações abusivas. Foram amizades, relações familiares, profissionais e inclusive relações amorosas. E hoje, pensar sobre essas questões me faz entender os impactos e influências que tiveram no meu comportamento, além de proporcionar que eu identifique o que ainda é resultado desses acontecimentos.
A vontade de me sentir pertencido nos espaços e relações era tão grande, que vinha carregado do medo de um possível abandono, por isso, por isso permanecer nesses lugares era mais importante do que os danos que traziam. Esse medo da solidão foi um combustível que impulsionou o distanciamento da minha essência e me fez acreditar que eu deveria suportar tudo e qualquer coisa para sustentar essa relações, afinal, era isso que me restava. No meu entendimento, não seria possível alguém gostar de mim, me conhecendo de verdade. Eu não fazia ideia de como essas violências me afetavam e por muito tempo essa foi a única forma que eu conhecia para me relacionar. Sendo assim, eu ia me podando, tirando partes de mim para caber nos lugares que me ofereciam e me sentir pertencido a qualquer custo.
Não sei exatamente onde isso teve início, mas as lembranças mais antigas que tenho desse sentimento, começam na minha infância. Entre meus colegas, eu sempre era ridicularizado. Quando a agressão não era moral (me apelidando com termos desumanos e constrangedores), era física; em ambas situações eu me sentia submisso, menor. Pior é que essas situações não me afastava dessas amizades, eu normalizava e aceitava a forma que me tratavam, e muitas vezes me sentia culpado quando havia algum desentendimento relacionado.
Com o passar do tempo, percebi que essas vivencias alimentavam uma necessidade de querer agradar a todos, guardando os incômodos para mim. E assim, deixei de dar atenção para as minhas vontades, priorizando o que eu achava que mais agradaria as outras pessoas. Nas relações amorosas, mais uma vez o tão conhecido lugar de submissão, como se eu tivesse o dever de estar disponível independente dos meus sentimentos. Essas experiências, além de moldarem minha baixa autoestima, contribuíram para formar uma identidade que não era minha, que por muito tempo eu tentei me apropriar, mas não consegui.
Hoje, voltar a esses episódios e analisá-los se faz necessário para que eu finalmente consiga identificar e nomear aqueles sentimentos que me atormentavam, e consequentemente rever minhas relações atuais para saber onde e quando isso ainda acontece. E a partir daí, me colocar como parte importante dessas relações e validar minhas necessidades e desejos sem deixar que o medo de ficar sozinho me paralise.
Talvez tenha sido a falta de um espelho de relações saudáveis, sobretudo relações envolvendo pessoas pretas, que influenciou essa passividade excessiva. Porém, hoje, adulto, eu posso ser a referência que eu tanto precisei. Entendi que para ter qualquer tipo de relação, primeiro tenho que ter uma boa relação comigo, me amar. Que o medo de estar sozinho, na verdade era um medo de me conhecer, afinal, como é possível amar algo que desconhecemos, não é mesmo? Hoje eu entendo que posso escolher estar em lugares que me façam bem; em relações que me agregam, que me valorizam e que me permitam, em toda minha complexidade humana, SER EU.